Mais que anunciar a impossibilidade de volta às aulas presenciais no semestre que ainda nem começou, a Universidade de Brasília precisa assumir de vez suas fragilidades na retomada das atividades a distância no cenário que vem sendo denominado de “novo normal” enquanto ainda não tivermos uma vacina contra o Covid-19.
Mesmo antes de iniciarmos a responder a pesquisa social enviada à comunidade de estudantes, técnicos(as) administrativos(as) e docentes, já sabíamos no privado de nossos departamentos, faculdades, centros e institutos o que nos espera de fora para dentro e de dentro para fora. O que isso significa? Ora, trata-se de diversos cenários que precisam ser discutidos profunda e amplamente em todas as unidades.
De fora para dentro, nos deparamos com o frágil acesso tecnológico de nossa comunidade discente quando está fora dos campi. Ainda em 14 de maio, já havia escrito sobre a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua sobre Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC, 2018), divulgada este ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ela nos mostra que uma em cada quatro pessoas no Brasil não tem acesso à internet. Em números totais, isso representa cerca de 46 milhões de brasileiros(as) que não acessam a rede mundial de computadores, entre eles(as) estão nossos(as) estudantes, um corpo de 48 mil entre graduação e pós-graduação de acordo com o Anuário Estatístico da UnB (2018/2019).
A pesquisa diz ainda que o acesso, realizado por aparelhos celulares, como ocorre com a maioria das pessoas, não permite aprendizado e preparo para os estudos. Além disso, essa juventude excluída tecnologicamente e mais vulnerável, ainda padece com a ausência de material de leitura atualizada, diálogos e ambientes favoráveis aos estudos e ainda ânimo para seguir aplicada nos estudos, que se tornam caros e ainda mais difíceis diante de outra parcela privilegiada de estudantes.
Ainda de fora para dentro estamos nós, 2.867 docentes e 3.213 técnicos(as) administrativos(as) (Anuário, 2018/2019). Dois segmentos da comunidade que sofrem por muitas pressões também compartilhadas com estudantes e que agora se desdobram com os afazeres domésticos, aulas remotas das crianças, cuidados com familiares em idade avançada e a rotina exaustiva de reuniões em vídeo, a chamada “Zoom fatigue”. Como se não bastasse, os(as) docentes ainda se deparam com a necessidade lançada de reorganização da oferta de aulas e conteúdos planejados para o presencial e que agora serão a distância.
Sim, temos que trilhar novos caminhos para fazer com o que o conhecimento chegue aos nossos(as) estudantes, mas não devemos cometer o erro de tentarmos reproduzir o que antes era “ao vivo” para uma aula online, apenas pelo fato de gravarmos um vídeo improvisado ou moderarmos uma sessão virtual em uma das milhares salas disponíveis na Internet. Em muitas delas, vemos câmeras fechadas, áudios contidos, sem sequer termos condições de interagirmos e observarmos os rumos que o conteúdo toma durante aquele momento que será tão difícil para a interação didático pedagógica entre os(as) professores(as) e os(as) estudantes.
Mas é importante que a sociedade saiba que nosso trabalho não parou. As aulas sim, foram suspensas, em respeito e proteção aos milhares de jovens que nos foram confiados a formação superior. Continuamos as pesquisas, atuando na gestão e em outras atividades em home office, na medida do possível protegidos(as), mas inseguros(as) permanecemos sem saber o que está sendo feito de dentro para fora a fim de que tenhamos melhores condições em sala de aula, segurança sanitária, adequação de ambientes para novos modelos de interagir nos laboratórios, rotas saudáveis e, portanto, promotoras da saúde.
Já se passaram quatro meses de pandemia e ainda não dispomos de ações estratégicas que garantam a sustentabilidade de nossa vida acadêmica, tão pouco iniciativas assertivas quanto a suspensão ou não do semestre letivo 1/2020.
Em ambos os sentidos que tomarmos, nossa UnB deve provocar a mudança no mundo e não apenas ser impulsionada pelas mudanças do mundo. Nossa comunidade foi criada para criar e assim promover ressignificações cotidianas, tendo como farol os desafios de produzirmos tecnologias criativas, sermos inovadore(as), inclusivos(as) e eficazes global e localmente, no ensino, pesquisa e extensão, nesse sentido, os números apontados em rankings são apenas uma das dimensões de nossa missão institucional.