O fato é que não temos vacinas nessa primeira fase para atender, sequer, os grupos prioritários, profissionais de saúde, idosos com 75 anos ou mais, idosos com mais de 60 anos que moram em asilos, indígenas que vivem em aldeias e comunidades ribeirinhas. E todos deverão tomar duas doses da vacina. Ou seja, serão necessários, em média, 30 milhões de doses. Repito, não há vacina que chegue para todos. Mas poderíamos fabricar, aqui no Brasil. Afinal somos o único país da América Latina que dispõe de duas instituições: Fiocruz e Butantan, capazes de produzir aproximadamente 30 milhões de doses/mês.
Ao invés de o Ministério da Saúde (MS) focar nesse investimento e outros insumos estratégicos a uma campanha nacional de imunização, foi obrigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a encaminhar o Plano nacional de operacionalização da vacinação contra a Covid-19 que já deveria ter sido elaborado desde o início da pandemia. E, diga-se de passagem, um documento difuso e incompleto, que nem mesmo as suas 93 páginas foram capazes de gerar segurança ou informações confiáveis para a gestão da comunicação de risco, para que os estados e municípios pudessem organizar as fases de vacinação, e finalmente os imunizantes chegassem nos braços dos brasileiros.
Sabemos pela mídia que o governo federal tem acordos com a AstraZeneca para fornecer 100,4 milhões de doses até julho deste ano; com a Covax Facility, consórcio organizado pela Organização Mundial de saúde (OMS) para obter 42,5 milhões de doses; e está em negociação com a Pfizer, a possibilidade de adquirir outros 70 milhões de doses. No entanto, a burocracia e a lentidão se impõem.
O STF, o Congresso Nacional, o Fórum Nacional de Governadores, a Frente Nacional dos Prefeitos, as Instituições de Ensino e Pesquisa, sindicatos e a sociedade em geral, devem pressionar o Ministério da Saúde para que acelere a aquisição dos imunizantes, evitando assim, a média móvel de mortes acima de 1 mil, e o aumento de casos, hoje registrado em 9.286.256 casos, com 226.383 óbitos, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa.
O povo brasileiro precisa compreender de vez que o dever de oferecer vacinas a toda a população é do governo federal. Se estados, municípios e o setor privado comprarem os imunizantes paralelo ao Ministério da Saúde o caos já instalado, só aumenta, pela falta de planejamento de muitas secretarias de saúde, entre elas a do Distrito Federal. Ao assistirmos idosos aglomerados, vacinas em “xepa” e fura filas, podemos batizar com um nome e sobrenome: abuso de poder e bagunça.
Precisamos evitar o aumento das sucessões de erros cometidos ao longo da pandemia. Para isso, não podemos abrir mão de um plano e estratégias para o controle da crise pandêmica e suas consequências; devemos nos preparar para receber as vacinas da Pfizer/BioNTech, (logística para refrigerá-las a 70oC), lembrando que os 5560 municípios, muito deles são marcados por forte desigualdade socioespacial no que diz respeito à oferta de serviços, equipamentos, profissionais, acesso, ou instabilidade à rede de energia elétrica. Recordemos o recente blecaute no Amapá.
Devemos ainda acelerar as compras de vacinas de outros países que já tenham seus registros aprovados pelas autoridades sanitárias, à semelhança da ANVISA, a exemplo do FDA (Food and Drug Administration), dos Estados Unidos; a EMA (European Medicines Agency), da Europa; a PMDA (Pharmaceuticals and Medical Devices Agency), do Japão; e a NMPA (National Medical Products Administration), da China. O que nos interessa é mais vacina e que cheguem para todos, com qualidade, segurança e eficácia. Claro, com documentação comprobatória dos resultados de todas as fases de testes pré-clínicos e clínicos.
Também não podemos abrir mão de um plano de comunicação de risco que previna a ignorância de pessoas que não pretendem se vacinar, expondo a si e ao próximo. Uma campanha nacional faz-se necessária para informar, que traduza o conhecimento científico para a sociedade, reforçando a confiança em fontes que combatam a desinformação, a ação dos grupos antivacina, o egoísmo e a falta de empatia e cidadania de quem não quer se vacinar.
Quem não se recorda com saudosismo, das campanhas nacionais com o personagem “Zé gotinha” que nos ajudou a realizar a vacinação em massa, tirando do mapa do Brasil a poliomielite em lugares dos mais remotos. Vacina, é preciso, mesmo que não estejam incluídos neste momento as mulheres grávidas e amamentando, pessoas vivendo com HIV, com comorbidades graves, ou doenças que comprometam o sistema imunológico.
Para garantir a nossa proteção é necessária uma cobertura de, no mínimo, 70% da população, a conhecida imunidade de “rebanho”, e mais, não deixarmos lacunas para a disseminação e espalhamento, junto às pessoas susceptíveis como hospedeiros, do SARS-CoV-2 e/ou suas mutações. Para isso, necessitamos de, no mínimo, 322 milhões de doses, sem desperdícios de um bem tão raro. Urge no pais salvarmos vidas e cuidarmos da saúde da população. Por isso, não cabe má gestão, fura fila ou xepeiros nos processos de vacinação, se quisermos uma nação solidária, livre do COVID-19 e digna do seu povo.