Mais uma vez somos prejudicados com as ações do desgoverno do Distrito Federal. O Decreto de condenação ao caos na Rede de Saúde e à morte da população entrou em vigor na última quinta-feira, 2. Não achatamos a curva e não só se normalizou, agora a morte das pessoas foi decretada. Considerada a unidade da Federação com a melhor condução das ações para o enfrentamento da pandemia, o Distrito Federal hoje encontra-se no pior cenário.
Há apenas três meses do primeiro caso, estamos em meio a suspeitas de fraudes em licitações e denúncias de suprimento inadequado de equipamentos de proteção individual (EPIs), de materiais com baixa qualidade e de falta de transparência nos dados de ocupação dos leitos. Tudo isso piora o cenário que já contabiliza 52.801 casos confirmados e 631 mortes por covid-19.
Desde as últimas medidas de flexibilização de setores da economia, os moradores do DF assistiram, diariamente, notícias do aumento exponencial de casos e óbitos. Somente nesta quinta-feira, 2, foram registrados mais de 30 óbitos e recordes nesse indicador viraram rotina. Quando a doença avançou nas áreas mais ricas da cidade, o Governo demonstrou preocupação e tomou medidas mais austeras, muitas até precipitadas, afinal, com menos de dez casos houve a suspensão de aulas, fechamento do comércio, de parques e proibição de aglomeração. Conquanto, nenhuma dessas medidas foi acompanhada de fiscalização efetiva e políticas sociais para sobrevivência básica que proporcionasse aos menos favorecidos condições de ficar em casa.
Todavia, o então governador de Brasília iniciou um flerte com o Governo Federal e foi exatamente neste ponto que nos condenaram à morte. Os dados sobre a ocupação de leitos foram retirados dos boletins diários e disponibilizados somente na Sala de Situação e de forma que apenas técnicos compreendem. Diversos servidores começaram a denunciar falta de EPIs, números de ocupação que não refletem a realidade, obras superfaturadas e inadequadas como o hospital de campanha no Estádio Mané Garrincha, que tem 179 leitos sem suporte de oxigênio.
Quando a doença chegou à periferia, os casos explodiram e seguem em ascensão. Todavia, o Governo mostra toda sua irresponsabilidade e falta de humanidade, e demonstra que para ele, as vidas da periferia pouco importam e decide que é hora de reabrir tudo. Decide, ignorando todas as medidas efetivas realizadas em outros países, as evidências e os apelos dos cientistas, que o governo distrital vai tratar uma doença desconhecida – para a qual não temos anticorpos, não existe testes suficientes, tratamento, ou vacina – como “uma gripe”. O GDF revela-se e assume o que sempre soubemos, tem o discurso e as atitudes alinhadas à necropolítica do Governo Federal.
A taxa de ocupação dos leitos públicos e privados continua crescendo. A rede pública está em 76,6% de seu limite e isso, sem computar os leitos de Unidades de Cuidados Intermediários. Estes, foram criados pelo GDF na tentativa de dissimular a real taxa de ocupação que, aliás, deve ser muito maior, pois há três dias, a Central de Regulação registrou 93% de ocupação dos leitos e a curva do Distrito Federal está em ritmo acelerado. Na rede privada o cenário é pior, pois há menos leitos disponíveis para covid-19 e a atual taxa de ocupação é de 91,6%.
Sem uma redução expressiva no número de casos, sem números reais de ocupação, sem medidas rígidas de distanciamento social e sem políticas sociais que permitam a sobrevivência básica da população pobre da capital federal – sim, há muitos pobres no DF –, qualquer medida de flexibilização e reabertura significa condenar a população à morte. Há crueldade e uma imensa contribuição do GDF para o genocídio dos mais vulneráveis, daqueles para quem os esforços deveriam ser priorizados.
A situação é séria e exige responsabilidade, participação das instituições de pesquisa e da própria sociedade que sequer tem direito a defender-se da condenação que recebeu e aqui não falamos da pequena parte que quer lucrar apesar das mortes, falamos da parte que sofre as consequências da ambição dos mais abastados. Os órgãos de controle e de defesa dos direitos sociais e civis precisam atuar, afinal, o mecanismo de freios e contrapesos é uma ferramenta de controle fundamental. Às universidades, como nossa Universidade de Brasília, cabe seguir na resiliência e na incessante busca de alertar quanto as consequências da falta de responsabilidade e políticas sociais adequadas ao enfrentamento da pandemia. Não é “uma gripe”. São vidas e todas elas importam.