E a desinformação invadiu o SUS deixando vidas à deriva

Em cadeia nacional nos fora comprovada mais uma desinformação sobre a pandemia do Covid-19, desta vez ecoada no coração do Brasil, a capital da República. E assim as redes de desinformação tecidas ardilosamente no país, estão perdendo sua capacidade de surpreender a nós, sanitaristas, educadores(as) e profissionais de saúde.

Já esperávamos notícia dessa envergadura quando vimos desaparecer do painel da sala de Situação do Governo do Distrito Federal[i], ainda em maio, o número de internações em UTI. Não somente estudos e pesquisas foram interrompidos, mas, vergonhosamente, de um dia para o outro, o GDF passou a apresentar ao cidadão(ã), informações pouco ou nada confiáveis.

Convenço-me, cada dia mais, que não devemos esperar outra postura de gestores que atuam sob o alicerce das falácias e inconsistências, neste particular, falo da saúde pública, pois ainda há outras incoerências entre atos de governo e promessas anteriores aos quais teríamos que dedicar muitos textos para analisarmos os desgovernos que pairam sobre o Distrito Federal e sobre a nação.  

Diferentemente de outros países, o Brasil teve um aviso prévio da pandemia da Covid-19, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretou Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII) em 31 de janeiro deste ano. Tempo razoável para que o país instituísse uma coordenação nacional com a participação do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Conselho de Secretários Municipais de Saúde (Conass), comunidade científica, entre outros, para juntos(as) elaborarem um plano estratégico de controle das infecções pelo novo coronavírus.

Em menos de um mês, foi divulgado no Brasil o primeiro caso da doença, em 26 de fevereiro, e até hoje a principal medida sanitária não foi cumprida em sua totalidade, o simples dever de casa: o isolamento social, único remédio para controlar a pandemia. Ao invés disso, tem se criado polêmica entre a vida das pessoas e a economia, confundindo-as, prejudicando a saúde mental de todos(as), gerando medo, inseguranças e o já conhecido estigma àqueles(as) que já foram vítimas do vírus.

O que chega em nossas casas são as cenas de uma guerra declarada contra a imprensa e a mídia, quando, de fato, deveríamos receber uma boa comunicação não violenta e que transmitisse confiança e esperança. Assim, além de bem informado, o povo estaria mais consciente sobre os cuidados com a sua saúde, além de confiar na ciência e auxiliar no gerenciamento de crises e respectiva prevenção da infecção pelo vírus. Muitos(as) inclusive, estão adoecendo, tratando-se, curando-se ou morrendo em casa, com medo de ir aos hospitais e unidades de atendimento por saberem que não há leitos ou profissionais suficientes e saudáveis para assistir suas dores.

Uma gestão ética e responsável contribui para disseminar ações que venham mitigar as consequências da pandemia. Em um momento de pico da doença como já nos fora alertado, não é apenas com o uso de máscaras, luvas ou uso de álcool em gel que impediremos as contaminações e mortes. Também precisamos de investimento em infraestrutura para nos adequarmos ao “novo normal” das nossas vidas enquanto a vacina não chega, e isto vale para as instituições de ensino em especial.

Além de mim, outros(as) colegas também estão buscando maneiras de fazer chegar à sociedade uma informação segura e transparente, fortemente baseada em evidências e que apontam o pico da pandemia entre nós. Os professores Jonas Brant (FS/UnB) e Wildo Araújo (FCE/UnB) destacaram diversos estudos epidemiológicos que nos alertaram que “essa abertura é completamente precipitada e será prejudicial quando sequer terminou o primeiro pico”.

Inúmeras são as pesquisas que nos alertam para a complexidade do Brasil em suas diferenças regionais e para o perigo do esgotamento da rede hospitalar. E nós, comunidade acadêmica das universidades brasileiras, fomos à luta por cada vida. Afinal, cabe-nos, conjuntamente, apoiar as instituições governamentais nas ações de investigações do novo coronavírus para entendermos os fatores de risco, aprimorarmos a comunicação e as ações de prevenção e tratamento.

Hoje, o mundo nos vê como país e agora como capital federal “irresponsáveis”, pois se não fosse a subnotificação, já tínhamos ultrapassado os Estados Unidos. Abrir comércio e escolas precocemente pode nos levar a crises dentro de uma crise ainda não controlada. Nem chegamos ao final do pico. A curva não caiu. Outros picos vêm aí e, infelizmente, de igual maneira, sem controle sanitário, isto porque, de um lado, as autoridades mundiais alertam, e do outro, os desgovernos desinformam e mascaram informações que deveriam ser públicas e oficiais, deixando nossas vidas à deriva.

 

[i] https://salasit.saude.df.gov.br/publicos-leitos-covid-19/

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